Fale com a gente

+55 41 9 9243-5848

Email

ola@vilabrahmi.com

Nosso horário

Seg - Sex: 9h às 17h

Uma das coisas que sempre me incomodaram muito no Ayurveda que chega até nós é a ideia de que este conhecimento milenar foi desenvolvido por homens, para homens. Mas a verdade é que essa ideia nunca me convenceu.

Como boa geminiana, sou muito questionadora e curiosa. Portanto, quando algo não me soa bem, vou a fundo, pesquiso, investigo, revolvo conhecimentos tão antigos quanto a própria Bíblia ou os Vedas. E na maioria das vezes encontro coisas — ou pessoas — surpreendentes.

Foi o que aconteceu quando encontrei Ma Bri Maya Tiwari, uma mulher tão doce e tão potente quanto possamos imaginar. Uma liderança feminina que nos lembra que não existe Shiva sem Shakti.

Que nos recorda que a Fonte da Criação é Aditi, que os segredos da cura estão contidos na Natureza, Prakrti, o Princípio Feminino Manifesto. E que o Ayurveda, em sua essência, nunca deixou de ser um conhecimento feminino.

A apropriação do patriarcado sobre essa sabedoria tentou — e tenta até hoje — apagar a nossa marca. Textos milenares foram editados, reescritos, reinterpretados para que não tivéssemos acesso ao nosso maior poder de todos: a cura.

E quando se trata da cura do nosso feminino, da nossa reconexão com os ciclos da Mãe Natureza, não podemos deixar de falar de Uttara Basti.

O que é Uttara Basti?

Se você pesquisar nos principais sites e livros de Ayurveda, vai encontrar que Uttara Basti ou Uttara Vasti é um tipo de enema aplicado por via vaginal ou uretral, cujo objetivo principal é pacificar vata dosha. Até aí, nenhuma surpresa.

Mas ao nos aprofundarmos no significado de Uttara, podemos vislumbrar um pouco melhor o que esse tipo de terapia pode nos proporcionar.

Em sânscrito, a palavra uttara significa excelente, superior, dominante, poderoso. Também pode significar transgredir e ser atravessado. Nesse sentido, podemos entender uttara como um portal.

Mas que portal é esse? O útero. Um portal que conecta dois mundos: o espiritual e o material, trazendo ao mundo o ser humano.

Inclusive, Ma Bri Maya Tiwari afirma que o significado de Uttara é justamente esse: útero, cosmos, aquilo que está preenchido.

A palavra Basti significa literalmente bexiga ou revestimento da barriga. Vasti, por sua vez, assume também um significado importante: morada.

Dentro dessa perspectiva, a terapia de Uttara Vasti vai muito além de pacificar vata dosha. Ela tem o principal objetivo de nutrir esse portal de vida, o útero, mantendo-o saudável.

Mas nem pense que isso se trata apenas de garantir uma gestação saudável.

Assim como em outras culturas, no sânscrito, garbha ou útero pode ser compreendido como templo, a parte mais interna de um santuário. Também pode ser entendido como cálice ou fruto do céu.

Nesse sentido, o útero é a base da criação, da criatividade, do nosso poder transformador. E Uttara Basti é cuidar desse templo para que ele seja próspero, abundante, energizante, a nossa própria fonte de vida.

Qual a importância do Uttara Vasti na saúde da mulher?

Se você tem acompanhado meus artigos, sabe que, assim como a Natureza, o Ayurveda é cíclico. Ou, melhor dizendo, esse conhecimento milenar nos faz retomar a nossa ciclicidade natural. E com o Uttara Vasti não poderia ser diferente.

Essa terapia nos ajuda a restabelecer o equilíbrio do nosso ciclo menstrual, que conhecemos como artavachakra. Nesse sentido, impacta em toda a nossa fisiologia, trazendo equilíbrio para as nossas vidas.

Se o nosso templo interior — o útero — está limpo, livre de toxinas, bem nutrido e em perfeito estado de saúde, isso se reflete em nosso ciclo hormonal, em nosso humor, no equilíbrio dos nossos dhatus, no equilíbrio da nossa mente e de tudo ao nosso redor.

E quem está por trás dessa fluidez? Vata dosha, é claro. Mais especificamente, apana vayu.

Ao mantermos apana vayu no seu ritmo natural, sem impedimentos para fluir pelos canais de circulação, também contribuímos para que os outros vayus — samana, vyana, udana e prana — estejam em equilíbrio. Logo, nosso corpo mantém o seu biorritmo natural.

Vale lembrar também que kapha e pitta são pangu, isto é, imóveis, sem a ação de vata dosha. Ou seja, esse processo de autocuidado pode ajudar a manter os três doshas em equilíbrio.

Alinhando seu ciclo menstrual com Uttara Basti

De acordo com Ma Bri Maya Tiwari, as fases da Lua ditam o biorritmo da mulher. Isso também não é novidade, afinal, muitas outras culturas afirmam exatamente o mesmo. E, quando estamos alinhadas com o ritmo lunar, menstruamos durante a Lua Nova e ovulamos durante a Lua Cheia.

Ao nos reconectarmos não só com a energia lunar, mas com os arquétipos das Deusas Lunares, entramos novamente no fluxo do nosso feminino interior, recuperando a nossa energia, vitalidade e conexão com o mundo que nos rodeia.

Então, passamos a fluir de forma mais tranquila pela vida, entendendo que existem momentos de maior atividade e momentos de maior introspecção. Também recuperamos o nosso empoderamento, mas a partir de uma visão de mundo feminina, focada no coletivo.

Com isso em mente, você pode começar esse realinhamento da seguinte forma:

Menstruou na Lua Nova?

Faça o Uttara Basti três dias após a cessação da menstruação, por três dias consecutivos ou alternados.

Menstruou fora da Lua Nova?

Faça o Uttara Basti a partir do segundo dia da Lua Nova, por três dias consecutivos ou alternados.

Minha professora de Striroga, Vd. Divya, também diz que podemos aplicar o Uttara Basti por três dias consecutivos, pausar três dias e repetir mais três dias.

Aqui, deixo uma receita de decocção indicada por Ma Maya no livro Women’s Power to Heal para você testar:

  • 2 xícaras de água
  • 1 colher de chá de triphala em pó
  • 1 colher de sopa de gel de Aloe vera

Leve a água para ferver em banho-maria. Adicione o pó de triphala, cubra e cozinhe por aproximadamente 3 minutos. Então, retire o recipiente e deixe a solução em infusão por 15 minutos. Coe com uma peneira. Despeje o gel de Aloe vera na solução e administre ainda quente.

Tratando desequilíbrios femininos com Uttara Basti

Quando se trata de doshas desequilibrados, em especial vata dosha, o Uttara Basti é considerado um procedimento de panchakarma. Portanto, não deveria ser feito por pessoas não-treinadas para realizar a terapia.

Neste caso, existe todo um processo preparatório antes do procedimento, bem como um processo posterior ao Uttara Basti que deve ser seguido. Portanto, é fundamental que uma terapeuta Ayurveda qualificada ou uma vaidya (médica Ayurveda) faça o acompanhamento.

Mas, a título de conhecimento, podemos aplicar o Uttara Basti em casos como: infertilidade, prolapso uterino, abortos espontâneos, miomas, bloqueios tubários, doenças uterinas e vaginais.

Também podemos empregá-lo no tratamento de doenças do sistema urinário e desequilíbrios menstruais.

Quando não fazer Uttara Vasti?

Como sempre, existem momentos em que o Uttara Vasti não é indicado. Portanto, é importante estar atenta a essas contraindicações, tanto na auto-aplicação quanto na aplicação em pacientes.

  • durante ou diretamente após a menstruação;
  • durante a gravidez;
  • quando houver qualquer sangramento ou hemorragia vaginal;
  • quando há excesso de calor ou clima frio;
  • diretamente após comer;
  • se estiver com diarreia;
  • após vômito, purgação ou enema;
  • emagrecimento acentuado recente;
  • menores de 16 anos;
  • maiores de 70 anos;
  • presença de carcinoma de colo de útero;
  • HIV;
  • hepatite B;
  • fístula vesico-vaginal.

Como você pode ver, o Uttara Basti é um tratamento que vai além da correção de doshas desequilibrados. Podemos usá-lo para restabelecer o ritmo normal do nosso ciclo menstrual e com isso contribuir para a nossa saúde global.

Além disso, o Uttara Basti é uma ferramenta de reconexão com o nosso feminino, com as nossas aspirações e modo de fluir pela vida. Mas, infelizmente, essa sabedoria que é tão natural e tão importante para nós, mulheres, foi sendo apagada ao longo de centenas de anos.

E um dos meus objetivos com a Vila Brahmi é justamente trazer de volta esses conhecimentos milenares, mostrando que o Ayurveda, como conhecimento da vida, não é domínio do patriarcado.

Pelo contrário, trata-se de uma sabedoria que nasceu do feminino e que se perpetua em essência pelo feminino, que é criação, que é vida, que é coletivo, que é ecossistêmico.

Espero que você tenha gostado deste artigo e nos vemos no próximo.

Com amor,

Eve.

Évelim Wroblewski

Évelim Wroblewski é terapeuta Ayurveda especializada em Ginecologia Ayurveda e Ginecologia Natural. Possui Formação em Medicina e Herbolaria Tradicional Andina e Formação em Partería Ancestral Andina. Cursa Formação em Kaya Chikitsa (Medicina Interna pelo Ayurveda), Especialização em Manas Vijñana (Psicologia e Psiquiatria pelo Ayurveda) e Especialização em Medicina Tradicional e Cosmovisão Indoamericana.

Você também pode gostar